Teatro para Bebês: a poética no jardim da primeira infância

Na noite desta quarta-feira, 4 de junho de 2014, estive novamente na Escola Porto Iracema das Artes no Encontro de Narrativas para a Infância, organizado pelo Festival de Teatro Infantil do Ceará (TIC), para participar da palestra de Carlos Laredo e Clarice Cardell, fundadores da companhia de teatro hispano-brasileira La Casa Incierta.

Criada em 2000, a companhia é pioneira no campo das artes cênicas para a primeira infância, realizando espetáculos cênicos e organizando programações e atividades formativas para artistas, educadores, pais e crianças. De 2006 a 2012, o grupo foi residente do Centro de Arte Fernán Gómez de Madrid (Espanha), onde organizava uma programação internacional permanente para recém-nascidos. Atualmente, o grupo reúne um repertório de oito espetáculos para bebês e vem desenvolvendo parcerias em países como Bélgica, França, Itália, Portugal e Rússia, além do Brasil, onde desde 2009 realiza o Festival Primeiro Olhar em colaboração com o grupo teatral Sobrevento (SP).

A palestra introduziu discussões em torno dos processos artísticos e pedagógicos em torno do universo teatral voltado para a primeira infância. A proposta é explorar o misterioso universo dos 5 primeiros anos de vida de um ser humano. A partir disso, será abordada a criatividade cênica para a primeira infância, dentro perspectiva do trabalho poético sobre a inocência e a invisibilidade por meio de exercícios práticos e teóricos no campo da dramaturgia e da encenação para bebês. Os professores compartilharam saberes e fazeres fundamentados em suas pesquisas e experiências em teatro para a primeira infância na Europa e Brasil nos últimos 15 anos.

Algumas informações importantes que anotei: 
- 0,079% do orçamento do Brasil é investido na Primeira Infância;

- Segundo UNICEF, Brasil tem a maior taxa de cesarianas no mundo, por mera comodidade da mãe e lucro dos médicos (virou um negócio). (ONS orienta que apenas 15% sejam por cesarianas). Vejam interessante matéria aqui;

- Infância requer delicadeza, cesariana é uma violência infantil. (Concordo plenamente! Ainda hoje guardo mágoa da Dra. Patrícia em função de meu filho não ter nascido de parto normal...);
- Infância em latim significa "aquele que não sabe falar";
- Cada som que a criança ouve, ativa uma área no cérebro infantil;
- Ser humano requer interação, olhar nos olhos, dar atenção as crianças;
- A linguagem surge para suprir o que está ausente. Por isso as crianças primeiramente apontam o que querem;
- O teatro permite a criança imaginar, mudar de papel, usar máscaras;
- Sempre perguntamos a criança o que ela vai ser quando crescer, sendo que o importante é o que ela já é!;
- Toda criança detêm dentro de si uma energia que precisa se relacionar;
- Total dependência, ou total indepedência são problemas. O ideal é um equilíbrio;
- Vivemos numa cultura cristã que ensina às crianças que há coisas diabólicas (raiz do termo é o mesmo utilizado em símbolo, metabolismo e significa “lançar para longe”, forças de separação, desunião e oposição.);
 - Separação existe desde o Éden (O anjo caído "separado" de Deus, devido o pecado de Eva, o homem se separa do Paraíso, etc);
- Uma criança é mais jovem ou mais velha? Depende do ponto de vista. Do genético, elas seriam mais velhas, pois a memória genética delas são mais velhas que as nossas... É a evolução...;
- Se queremos uma sociedade estrangeira de sua própria cultura, basta não fazer arte para a Primeira Infância;
- Amamos mais o conhecido que o desconhecido;
- Porque não produzir dramas para as crianças, se o que elas vivenciam desde o nascimento são situações dramáticas: o parto, o primeiro passo (aprender a andar), a primeira fala, a ida à escola, etc;
- As crianças percebem o que está por trás das máscaras...;
- A arte é uma aventura ao desconhecido;

A palestra foi encerrada com um belíssimo poema de Federico García Lorca (1898-1936), poeta e dramaturgo espanhol, e uma das primeiras vítimas da Guerra Civil Espanhola, relatado em 1928 numa conferência sobre canções de ninar. "Matamos nossos próprios poetas", disse Carlos Laredo. Segue um guia de leitura "Meu Coração é tua casa" de Frederico García Lorca. Vale a leitura!

Houve também uma mesa redonda, com 2 pensadores de diferentes linguagens falando sobre as experiências locais. Primeiramente a Ana, do Instituto da Infância (Ifan) que apresentou alguns projetos e ressaltou a importância da primeira infância. Apresentou também a Rede Nacional e o Plano Nacional da Primeira Infância. Interessante a visão holística do universo da criança.

Por fim, foi a vez do Tonico Lacerda, do Teatro Plural, expor seus pensamentos e seu trabalho de fomento e ensino das artes cênicas para bebês. Segundo ele, informação e arte só tem razão de existir se for compartilhada. Não existe método de ensino para bebês. As máscaras não são feitas para esconder, mas para revelar. Por fim apresentou um lindo vídeo, com alguns "métodos" utilizados com crianças. O "Encontramento" - encontro e encantamento, a "compartilhança" - compartilhamento e confiança, onde o adulto precisa se tornar uma criança, o "percepceudos" - percepção e medos, "experimemplos" - experiências e exemplos, criança vê, criança faz e por fim a "brincalização" - bricadeira e realização. A companhia teatral, não forma artistas, mas consciência emocional.

Houve algumas perguntas da plateia, e o evento teve que ser encerrado em função do avançar das horas. Destaco a participação do Sahel, meu filho, que na palestra do Carlos Laredo serviu diversas vezes como exemplo, tendo inclusive seu desenho utilizado durante sua apresentação. Concluo, que a formação de plateia, depende em muito da família. Uma criança não consegue ir sozinha a uma apresentação teatral, ela depende de seus pais, que muitas vezes priorizam outros afazeres em detrimento da formação cultural das crianças.