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segunda-feira, 28 de outubro de 2019

Revendo Coringa


Revi sem conceitos pré concebidos o drama Coringa [Joker, Estados Unidos, 2018], de Todd Phillips e me encantei ainda mais com essa brilhante obra, que mergulha na psicologia do personagem título para nos entregar mais uma atuação marcante de Joaquin Phoenix.

Coringa é uma história original do vilão nunca antes vista no cinema. A versão de Phillips sobre Arthur Fleck (Phoenix), um homem desprezado pela sociedade, não é só uma visão realista do personagem, mas também uma lição de vida. O filme é extremamente corajoso ao se apresentar com a devida censura de 18 anos e ser transgressor de modo que é condizente com a essência do personagem-título. Vemos muitas referências a Martin Scorcese no longa, especialmente aos filmes Taxi Driver - Motorista de Táxi (1976) e O Rei da Comédia (1982). Fica claro que Phillips queria não só dar um tom específico ao seu primeiro projeto dramático, como também homenagear o celebrado cineasta. O personagem de TV Murray Franklin, óbvia referência (invertida) ao seu papel dirigido por Scorsese em 1982. Entre as várias referências a Taxi Driver, vemos a famosa cena em que Bickle, já completamente tomado pela loucura e exaustão, simula dar um tiro em sua cabeça com seus dedos.   

Existem vários momentos em que o longa faz alusão às HQs, como o Asilo Arkham. Um dos mais icônicos lugares dos quadrinhos do Homem-Morcego, Arkham está presente no filme como o Hospital Estadual Arkham, onde Arthur Fleck já havia sido internado e onde sua trajetória acaba, além de ser onde o perturbado homem vai buscar mais informações sobre o passado de sua mãe.

Sem ser diretamente baseado em um Coringa dos quadrinhos, a versão do vilão em "Batman: A Piada Mortal" foi a maior inspiração para Phillips. A carreira falha como comediante e os problemas familiares são os pontos mais fortes, mas isso fica muito claro quando Arthur Fleck faz referência a uma das mais conhecidas falas do Palhaço do Crime do romance gráfico: "Só é preciso um dia ruim para reduzir o homem mais saudável à loucura. É o quão longe está o mundo de onde estou. Apenas um dia ruim." No seu último momento com Sophie (Zazie Beetz), Arthur fala que teve um dia ruim, e é a partir daí que seus atos passam a se tornar cada vez mais violentos e seus planos assassinos vão tomando corpo.

Todd Phillips conseguiu fazer com que a família Wayne estivesse presente sem a participação de um Bruce Wayne já trabalhando como herói Batman. O Wayne mais importante é Thomas (Brett Cullen), pai de Bruce. No filme, a mãe de Arthur confessa a ele que Thomas é seu pai, e o psicopata não quer nada mais do que se aproximar do empresário. Indo à casa dos Wayne, Arthur conhece Bruce (Dante Pereira-Olson) e Alfred (Douglas Hodge), e quando finalmente consegue chegar perto do homem que acredita ser seu pai, não só é rejeitado como descobre que na realidade foi adotado.

Thomas Wayne é apresentado no filme como um grande empresário que promete acabar com a pobreza e violência de Gotham, quando anuncia sua candidatura a prefeito (uma referência ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump). Porém, todo o filme é uma crítica à alta sociedade que vive no luxo, ignorando os pedidos de ajuda e socorro da população mais pobre. A última aparição dos Wayne acontece no fim do filme, quando as ruas de Gotham estão comandadas pela classe trabalhadora insatisfeita. Saindo do cinema, mãe, pai e filho tentam escapar da loucura que está acontecendo cortando caminho por um beco, no qual Thomas e Martha são assassinados, enquanto Bruce presencia a morte de seus pais. O filme acaba com a criação do trauma que viria a criar o Homem-Morcego.

Um dos maiores clássicos da filmografia de Charles Chaplin (e da história do cinema), Tempos Modernos tem uma ligação tão forte com o filme de Phillips que é literalmente exibido dentro de Coringa.

No final do filme, após anunciar ser o palhaço assassino procurado pela polícia durante sua aparição no programa de televisão de Murray Franklin (Robert De Niro), Arthur Fleck terroriza a plateia com aquele desfecho chocante do longa. Preso pela polícia, o Coringa aparece na cena seguinte no banco de trás do carro das autoridades, uma clara referência a uma das mais icônicas cenas de Batman - O Cavaleiro das Trevas. No filme dirigido por Christopher Nolan, o vilão interpretado por Heath Ledger consegue escapar da polícia, e passeia pelas ruas de Gotham no banco de trás do carro, com a cabeça para fora aproveitando o vento e o caos que está criando na cidade. 

Na versão de Todd Phillips, o Palhaço do Crime parece calmo e pleno durante seu passeio na viatura. Ele surge olhando pela janela para a destruição sendo causada pelos moradores de Gotham, que chegaram ao estopim de seu descontentamento com o governo. Depredação, incêndios e gritaria, Arthur observa o que seus atos geraram nos "palhaços" mascarados da cidade. Assim como o personagem de Heath Ledger, ele consegue escapar do veículo, porém desta vez de forma acidental. E então, ao invés de só observar, ele é ovacionado pelos membros da classe trabalhadora, que o viram como o líder de uma revolução. 

O filme produzido por Phillips e Bradley Cooper e foi pemiado no Festival de Veneza deste ano, tendo fortes chances de indicações a várias categorias no Oscar 2020.

Veja o teaser trailer de Coringa:

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