terça-feira, 18 de junho de 2019

Filhas do Sol


Drama Filhas do Sol [Les Filles du Soleil, França, Bélgica, Geórgia, Suíça, 2018], de Eva Husson é um belíssimo manifesto feminista, de uma jornalista que acompanhou durante três dias, um grupo de guerreiras do Curdistão, que pegaram em armas contra os grupos que sequestraram, estupraram e venderam mais de sete mil mulheres na região de guerra, em países como Turquia, Irã, Síria e Iraque. O empoderamento feminino nunca esteve tão em alta.


A trama companha Bahar (Golshifteh Farahani) uma advogada que estudou na França, e comanda o batalhão das Filhas do Sol, formado por ex-prisioneiras e escravas sexuais. Esse batalhão composto apenas por mulheres curdas atua ofensivamente na guerra do país. Ela e as suas soldadas estão prestes a entrar na cidade de Gordyene, local onde Bahar foi capturada uma vez no passado. Mathilde (Emmanuelle Bercot) é uma jornalista francesa que está acompanhando o batalhão durante o ataque. O encontro entre as duas mulheres, dentro do cenário caótico que as cercam, irá mudar a vida de ambas permanentemente. Apesar das diferenças culturais, Mathilde e Bahar têm muitas coisas em comum, como o medo, a saudade da família, uma profunda melancolia, causada por tudo o que presenciaram na guerra.

Os curdos são um povo sem Estado, formado por aproximadamente 25 milhões de pessoas e aspira à sua independência política e territorial. A principal religião são muçulmanos sunitas. O conflito armado que está ocorrendo desde 2012 na Síria por parte da população curda desse país contra o governo de Bashar al-Assad e contra grupos jihadistas que atuam no seu território, no contexto da Guerra Civil Síria.

O filme tem um ritmo interessante, cria um clima de tensão absurdo e apesar dos acontecimentos acontecerem apenas em três dias, temos flashbacks que complementam a história, alguns excessivamente longos, mas todos necessários para contextualizar os acontecimentos narrados pelo longa selecionado para competir no Festival de Cannes 2018. Assim, ver o grupo de guerreiras em ação é tão interessante quanto saber as histórias que levaram aquelas mulheres até aquele estágio.

O pano de fundo para “Filhas do Sol” é o massacre de Sinjar, ocorrido em 2014, no qual o Estado Islâmico praticou um genocídio contra os yazidi, uma minoria religiosa monoteísta. O monte Sinjar, no nordeste do Iraque, foi o local escolhido pelo Estado Istâmico (EI) para começar o massacre. Em 3 de agosto de 2014, o EI cercou a área de Sinjar, mantendo os yazidi sem comida ou água durante dias. Mulheres foram separadas dos filhos. Mulheres foram vendidas como escravas sexuais, inclusive, meninas. Estima-se que 5 mil pessoas foram executadas durante o massacre

A diretora fez um belo trabalho, ao dar close nessas mulheres que mostram uma força sobrenatural. O que elas tem o comum? São mães, que tiveram seus filhos mortos ou sequestrados. A coragem que fazem elas não temer o combate, diz respeito a seus filhos desaparecidos, mortos ou distantes. Bahar parte numa missão suicida, à procura de seu filho numa escola da região, sendo treinado para atuar com armas. Numa das cenas mais fortes do filme, vemos outra combatente que estava prestes a dar à luz, tendo que cruzar uma fronteira durante uma fuga. Algo espetacular e altamente crível. De acordo com a diretora, a inspiração para “Filhas do Sol” surgiu a partir de uma situação real em sua família: o avô dela participou da Guerra Civil Espanhola. Ver a guerra com o olhar feminino, nos leva às lágrimas diversas vezes.

As atrizes dão um show à parte. Muito seguras e determinadas encarnam as personagens de modo verossímil, especialmente na solidariedade feminina em meio às adversidades. O filme se torna universal, ao não se deter no conflito curdo, suas origens sociais, religiosas e políticas, mas nas mulheres estrategistas, habilidosas, e com muita coragem para enfrentarem seus desafios. Na cena final, ouvimos a leitura solene da reportagem de Mathilde, e o público saúda com um caloroso aplauso ao final da sessão.

Veja trailer de Filhas do Sol:

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